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DIA MUNDIAL DA CRIANÇA

Relembramos, hoje, 1 de Junho de 2019, que a Convenção dos Direitos da Criança deverá ser entendida como uma Nova Carta para a Consagração dos Direitos da Criança projectada e ampliada a partir da Declaração dos Direitos do Homem.
A nova cultura que deverá inspirar as nossas sociedades e os nossos estados terá de ser construída nesta abordagem de uma ética centrada na criança que, por sua vez, determinará todos as outras disposições legais e políticas, do Ambiente à Educação, da Saúde à Justiça, da Segurança Social à Intervenção Familiar.

Todos percebemos e sentimos que o «Dia da Criança» é ou deverá ser cada dia da existência humana, cada dia da nossa vida.
Antoine de Saint Exupéry, pela boca do seu «Petit Prince» lembrou-nos que todas as pessoas crescidas, todos nós afinal, já uma vez fomos crianças!
Se bem que os segredos da reposição neuronial tenham determinado o «esquecimento» de muitas das vivências da nossa infância, creio que quase todos assumimos uma nostalgia de saudade da nossa meninice e, porventura, uma certa frustração de não sermos capazes de lembrar mais, de não conseguir trazer ao domínio do consciente mais recordação, mais perspectiva, mais evidência.
Se é que para muitos de nós, muitas das melhores emoções do quotidiano são povoadas pelas melhores recordações da infância, para muitos outros, forças brutais do ser afectivo e mental empurram o passado para as trevas do esquecimento, procurando não trazer à luz da confrontação do presente, as lágrimas da injustiça, o pesadelo da agressão, o pesar do não brincado, a angústia do mal amado.
«Todas as pessoas crescidas já foram crianças uma vez» poderá ter sido, para muitos mais uma oportunidade feliz para recordar, quando porventura, depois de acordados, alguém lhes lembrou, na rádio, num qualquer jornal ou no café da manhã que o dia 1 de Junho é o Dia da Criança.
Porém, o que o «Petit Prince» nos diz do alto do seu «asteróide» qual só mais uma estrela que, de repente, sentimos como nossa, na imensidão dum firmamento azul é, porventura, quase o mesmo em palavras mas brutalmente diferente em sentido - «todos vós já fostes criança uma vez», mais de um terço da vossa vida!
E todo este tempo não deu para ajuizar, para inspirar que o resto da vida não pode deixar de ter um só sentido, um só objectivo, uma só razão de ser?
Eu creio que o que o «Petit Prince» nos quer dizer, qual sentido de coerência da nossa vida feito superego, feito resiliência em cada novo dia é o de que a nossa missão de cidadãos do mundo, em cada um dos nossos «asteróides» é, tão só, a de fazer proporcionar a cada uma das crianças por que somos responsáveis, a cada uma das crianças que connosco coabita entre ovelhas, flores e baóbás, a oportunidade de ter acesso a tudo que mais amamos e desejamos.

Cada criança seria, assim, a flor que cada dia temos que regar para que nunca, nunca mais, essa flor se possa esquecer que fomos nós que a fizemos crescer, de modo a poder , da flor passar a raposa, a estrela, a um novo «Petit Prince».
A viagem de cada um de nós pela criança que fomos tem muito a ver com a viagem que temos de empreender para fazer da nossa missão na terra a de regadores da flor sentida como nossa responsabilidade.
As nossas crianças, em cada instante da sua vida vivem o risco de não terem quem as proteja da sua extrema vulnerabilidade nas suas próprias casas, nas escolas, nas ruas, nas estradas, no ar respirado, no direito a ser e a ter.
Os poetas da Criança têm de ser hoje os cidadãos de um mundo atento ao futuro, têm de ser cada um de nós.
Temos de aprender a ganhar mais saber, a usar melhor esse saber, a transmitir mais e melhor o saber, o querer e o sentir.
Neste sentido, a Convenção dos Direitos da Criança deverá ser entendida como uma Nova Carta que projecta na Criança a consagração fundamental da Declaração dos Direitos do Homem.
A Convenção dos Direitos da Criança é a grande proclamação ética centrada na Criança.
A nova cultura que deverá inspirar as nossas sociedades e os nossos estados terá de ser construída nesta abordagem de uma ética centrada na criança que, por sua vez, determinará todos as outras disposições legais e políticas, do Ambiente à Educação, da Saúde à Justiça, da Segurança Social à Intervenção Familiar.
A criança não será mais, assim, o ser dependente, o menor cívico, o sujeito de vulnerabilidade.
Os governos dispõem, hoje, através da Convenção de uma Carta de Princípios que os obriga a privilegiar a Criança no seu existir pleno prevenindo as provações, as negligências, a violência.

A garantia de oportunidades de afecto, de vínculos, de harmonia familiar, de concentração de interesses decorre da vivência do que é o interesse superior da criança a mobilizar políticas e regulamentações sociais.
O Direito não poderá ser uma regulamentação dos direitos sobre a criança mas outrosim, uma afirmação dos direitos à Criança.
Toda a circunstância da criança, designadamente a familiar, tem de ser inspirada por este Direito à criança que pressupõe o primado da sua dignidade e o interesse superior de a respeitar.
A projecção deste interesse em todas as expressões das Ciências Humanas está contida num dos componentes do Preâmbulo da Convenção - ... «a criança para o desenvolvimento harmonioso da sua personalidade, deve crescer num ambiente familiar, em clima de felicidade, amor e compreensão ...».
Se a Sociedade actual, na nossa cultura, reconhecesse que a prioridade social era a criança tendo em conta os seus interesses superiores e se neste contexto estivesse garantido o pressuposto que o interesse superior da criança é o de ser respeitada e amada, fundamentalmente dentro da sua família, então todo o pensamento político inspirador da actividade dos governos seria o de viabilizar uma cultura familio-cêntrica com inequívocos investimentos na construção familiar e na relação vinculadora desde os primeiros tempos de vida.
É preciso criar condições para que haja paixão na espera por cada nascer, na descoberta do quem é quem logo que cada bebé nasce, no apoio dinâmico à explosão de cada temperamento projectado no modo de comer, de dormir ou de brincar.
Direi, no modo de Ser.

João Gomes-Pedro, 2019